A democracia e a rebelião contra Deus
Em nome de Deus, O Clemente, O Misericordioso
Está disseminada nas sociedades seculares a crença no valor superior e incontestável da democracia. Não é por outra razão que os políticos estão sempre prontos para incluir essa palavra nos seus discursos. E, para reforçar essa crença, sempre se contrasta a democracia com a ditadura, com a opressão, com o arbítrio e com a intolerância.
Assim, se constrói uma série de gatilhos emotivos, prontos a serem disparados na mente das pessoas ao ouvirem a palavra “democracia”. Mesmo, muitas vezes, sem o ouvinte saber exatamente o que vem a ser uma democracia, ele está pronto para aderir ao que lhe pareça estar mais em harmonia com ela, razão pela qual se faz necessário superar os clichês a fim de, alcançando uma compreensão mais madura sobre o tema, não sermos facilmente manipulados pelos demagogos.
Como é sabido, nominalmente, a palavra democracia surgiu no século XIX adaptada do francês démocratie, por sua vez, derivada do grego demokráteia, significando governo do povo (CUNHA, 2010, Dicionário etimológico da língua portuguesa). Como não é possível haver sempre unanimidade, ficaria prevalecendo a decisão da maioria.
O termo é contraditório por si só, pois, se é o povo quem governa, então quem é o governado? Povo é uma coletividade humana e, observamos que, sempre em que há agrupamentos humanos, também há a necessidade um líder, um governante, de alguém que vai tomar algumas decisões por todos, ainda que, às vezes, consultando os liderados.
Quanto maior for a coletividade, mais inviável fica a possibilidade de todos os membros dela participarem de todas as tomadas de decisão, até porque decidir é emitir um juízo de valor sobre algo, é escolher, dentre as possibilidades, aquela que estiver mais em harmonia com o conjunto hierarquizado de valores que o tomador de decisão tem, mas, para se chegar a uma conclusão, a pessoa deve estar ciente dos fatos.
Isso é bastante claro nos casos judiciais, nos quais a decisão do magistrado depende profundamente das provas apresentadas pelas partes em relação ao caso em litígio. Na esfera comunitária, como seria possível que todos do povo tivessem que gastar tempo para tomar ciência de todos os assuntos e de todos os possíveis desdobramentos de uma decisão ou de outra?
Isso é tão evidente que as sociedades seculares aplicam formalmente a democracia no sentido de “governo dos representantes do povo”. Portanto, não é, precisamente, o governo do povo, mas sim o governo de uma elite, que, inclusive, não corresponde necessariamente aos políticos eleitos. São, de fato, aqueles que viabilizam não apenas a eleição, mas também os meios para o exercício do poder, razão pela qual o que se chama de democracia é a velha e conhecida oligarquia, que é o governo de poucas pessoas.
Na linha do supracitado, a tomada de decisão envolve ao menos dois fatores: a ideologia e o conhecimento dos fatos. Sendo assim, mesmo o pequeno resquício daquilo que possa nos remeter à democracia na organização política das sociedades seculares, que é a consulta regular do povo quanto à escolha dos governantes (eleições periódicas), está comprometida por causa da educação pública e dos grandes veículos de comunicação e de entretenimento.
As crianças não têm sido mais educadas pelas mães, pois estas precisam ser “fortes” e “independentes” e entregar os filhos (quando os têm) para estranhos cuidarem deles. Sendo assim, as crianças são formadas a partir de um sistema ideológico governamental (ainda que disfarçado de não-ideológico). E isso é assim tanto em relação àquelas crianças matriculadas escolas nas públicas como nas privadas, pois, estas necessitam seguir as diretrizes gerais do governo para terem autorização de funcionamento.
Os grandes veículos de comunicação (cujo funcionamento depende não apenas da autorização governamental, mas também de verbas publicitárias, sejam elas governamentais ou privadas) completam o trabalho sedimentando a ideologia por intermédio do entretenimento (filmes, novelas, programas de comédia…) e seleção e comentário de notícias a partir de uma dada ideologia. Não que exista apenas um grupo a controlar tudo isso, mas são, certamente, conglomerados, elites financeiras.
Como o povo, por sua vez, não tem tempo para se dedicar à política, pois, na sua grande maioria, precisa trabalhar para sobreviver, apenas segue reproduzindo automaticamente aquilo para que fora programado, desde a infância, para fazer: votar em um daqueles que a elite apresenta como candidatos, crer naquilo em que foi condicionado para crer e saber aqueles fatos que lhe são apresentados como verdadeiro, de forma que o único parâmetro objetivo de realidade que tem é a sua condição material mais imediata, por exemplo, se está com fome ou não.
Sendo assim, podemos definir democracia, na prática, como sendo o regime de governo no qual uma elite governa de forma dissimulada por intermédio de prepostos, chamados políticos, que melhor personifiquem e ratifiquem a ideologia vigente posta em circulação pela própria elite por meio, especialmente, da educação pública, do entretenimento e do noticiário.
A rigor, todo o governo é, de certa forma, oligárquico, pois, mesmo um monarca necessitará de uma corte para auxiliá-lo, assim como todo o governo é, em alguma medida, democrático, no sentido de depender de algum apoio popular para se manter. Portanto, não há problema nesse aspecto oligárquico. Na verdade, não há como ser diferente. O problema está na dissimulação, na ocultação dos verdadeiros detentores do poder. Também não há problemas em se estabelecer uma política de doutrinação da população desde a infância, o problema, mais uma vez, está na ocultação, na mentira; está no conteúdo da doutrina adotada; está em dizer que está promovendo uma educação neutra de ideologia (o que é impossível) quando, na verdade, se está promovendo o emburrecimento do indivíduo para transformá-lo em apenas um tolo útil.
A crença de que a vontade popular deva ser sempre satisfeita e estar em primeiro lugar é, inclusive, um alto fator de vulnerabilidade da própria sociedade, pois, uma comunidade pode estar sendo vítima de ataques ideológicos provenientes de grupos rivais com o intuito de derrubar um governo que se imponha como uma barreira à dominação daquele grupo.
Assim, uma elite rival pode, por exemplo, financiar ativistas para fomentar a insatisfação, pode instigar ideologias de enfraquecimento dos homens e das famílias da outra comunidade etc. Como a ideia de democracia não nos dá critérios fixos e claros de certo ou errado, a comunidade ficará mais vulnerável quanto a tais ataques.
Na verdade, o regime de governo que nos conduz à realização plena da dignidade humana, da virtude e de justiça, e que possui valor por si só, não é a democracia, mas sim a submissão a Deus, nomeada pela palavra árabe transliterada para o português como Islam. Isso porque tudo pertence a Deus, uma vez que por Ele foi criado e por Ele é sustentado e só Ele é capaz de nos dignificar enquanto seres humanos. Não há ninguém com intenções mais nobres que Ele e não há ninguém mais conhecedor dos fatos do que Ele.
A substituição da lei de Deus pela vontade da elite (vontade humana de forma geral) é um expediente muito antigo e se caracteriza como rebelião contra o Altíssimo, pois a submissão a Deus se dá com a implementação da Lei revelada por Ele, a Sharia, sendo a vontade da maioria aplicada apenas de forma subsidiária e na medida do possível.
Dentre os que praticam o judaísmo, há os que alteram o sentido das palavras dO Livro e dizem: “Ouvimos e desobedecemos” e “Ouve, oxalá não ouças.” E dizem: Raᶜina deturpando a verdade, com suas línguas, e difamando a religião. E, se eles dissessem: “Ouvimos e obedecemos” e ” Ouve” e “Olha-nos”, ser-Ihes-ia melhor e mais reto. Mas Allah os amaldiçoou por sua renegação da Fé. E não crerão, exceto poucos. (Alcorão 4:46)
Diante dessas considerações, conclui-se que a democracia não passa de uma falácia utilizada por demagogos para manipular o povo e rebelar-se contra Deus, tendo, ainda, como reflexo, a vulnerabilidade de comunidade diante de inimigos externos e que o governo só é justo quando aplica os critérios divinos de julgamento consubstanciados na sharia islâmica. É nesse aspecto ideológico, e, portanto, eminentemente humano, que se pode falar, a respeito de um governo, de virtude ou vício; de justiça ou opressão; de legitimidade ou ilegitimidade.
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