A dignidade da pessoa humana numa perspectiva secular e islâmica
Consoante a legislação pátria (inciso IV do art. 1º da Constituição Federal), a dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos do Estado brasileiro e, para a doutrina jurídica, o princípio mais importante e do valor mais precioso do ordenamento jurídico nacional (FARIAS e ROSENVALD, 2008, Direito Civil Teoria Geral), estabelecendo-se como o fim supremo de todo o direito cujos efeitos se expandem nos mais distintos domínios normativos para fundamentar toda e qualquer interpretação (SILVA NETO, 2009, Curso de Direito Constitucional).
Conquanto seja de fácil constatação a importância desse valor ou princípio, o mesmo não pode ser dito da sua definição. Afinal de contas, o que vem a ser a dignidade a pessoa humana? Quais são as condições nas quais esse valor é preservado e em quais ele é vilipendiado? E mais, como saber, inclusive, que esse valor existe e existe igualmente para todas as pessoas?
As tentativas de conceituação de dignidade da pessoa humana costumam girar entorno da concepção do homem como um fim em si mesmo e não como um instrumento para alguma coisa acrescida prerrogativa de cada um definir quais seriam seus próprios fins, de traçar o próprio caminho (TAVARES, 2013, Curso de Direito Constucional). Sua efetivação é dito depender do respeito à integridade física e psíquica, da existência de pressupostos materiais mínimos à sobrevivência e da existência de liberdade e de igualdade. Já as provas e existência desse princípio são associadas à nossa experiência intuitiva.
De fato, dignidade humana é um importantíssimo valor. O seu grau de abstração é enorme, pois é muito mais sutil que a alegria, que está no âmbito das emoções. Nós apenas conseguimos alcançar plenamente o significado desse valor recorrendo à revelação divina, pois tentar relacionar esse princípio com a elevação do homem ao patamar divino, considerando-o como medida de todas as coisas e como um fim em si mesmo é um erro, pois é incompatível com a própria natureza humana.
A nossa experiência física confirma o nosso conhecimento intuitivo segundo o qual, nós, seres humanos, ocupamos uma posição privilegiada comparativamente aos outros seres ao nosso redor e não de caráter meramente biológico evolutivo, mas sim de âmbito espiritual. E a revelação divina explica isso com maestria nos seguintes termos:
۞وَلَقَدۡ كَرَّمۡنَا بَنِيٓ ءَادَمَ وَحَمَلۡنَٰهُمۡ فِي ٱلۡبَرِّ وَٱلۡبَحۡرِ وَرَزَقۡنَٰهُم مِّنَ ٱلطَّيِّبَٰتِ وَفَضَّلۡنَٰهُمۡ عَلَىٰ كَثِيرࣲ مِّمَّنۡ خَلَقۡنَا تَفۡضِيلࣰا
E, com efeito, honramos os filhos de Adão e levamo-los por terra e mar e demo-lhes por sustento das cousas benignas, e preferimo-los, nitidamente, a muitos dos que criamos.Alcorão 17:70
Contudo, essa honra diante do restante da criação não deve levar ao ensoberbecimento ao ponto de se achar um fim em si mesmo, pois esse atributo é exclusivo de Deus, O Autossuficiente, aquele que prescinde de todas as coisas (Alcorão 112:1-4). O ser humano, por sua vez, necessita de muitas coisas, dentre as quais a companhia e a interação com outros seres humanos. E essas relações interpessoais, inerentes à própria humanidade, são incompatíveis com a concepção de cada um como sendo um fim em si mesmo e com a priorização das vontades individuais. Em outras palavras, o homem não é um fim em si mesmo porque ele necessita mitigar a própria vontade em prol da convivência em grupo, tanto familiar como social, como parte mesmo da sua essência humana.
O que vemos, inclusive, é justamente o oposto de qualquer compreensão instintiva de dignidade quando a pessoa se entrega excessivamente às próprias paixões. Vemos indivíduos totalmente incapazes, sujos, mal cheirosos e doentes pelo efeito das drogas. Vemos outros que perdem o trabalho de uma vida em razão do Vício em jogos de azar. Vemos também aqueles que se mutilam e praticam atos contrários à própria constituição biológica por conta de fetiches sexuais e assim por diante.
Assim, fica claro não ser possível chegar ao menos no conceito correto de dignidade humana partindo de uma ótica secular, quem dirá efetivá-la. Embora aspectos materiais de bem estar e conforto possam ser inerentes a uma condição de dignidade, é no aspecto espiritual da fé que ela se realiza em plenitude. Tanto um homem como um animal podem se saciar a fome, mas apenas o homem pode jejuar em obediência e adoração a Deus. Tanto um homem como um animal podem desfrutar de conforto, mas apenas o homem pode arriscar a vida em nome de uma convicção, em nome de um dever moral.
E como os textos sagrados tratam a dignidade humana?
هُوَ ٱلَّذِي بَعَثَ فِي ٱلۡأُمِّيِّينَ رَسُولࣰا مِّنۡهُمۡ يَتۡلُواْ عَلَيۡهِمۡ ءَايَٰتِهِۦ وَيُزَكِّيهِمۡ وَيُعَلِّمُهُمُ ٱلۡكِتَٰبَ وَٱلۡحِكۡمَةَ وَإِن كَانُواْ مِن قَبۡلُ لَفِي ضَلَٰلࣲ مُّبِينࣲ
Ele é Quem lhes enviou um Mensageiro vindo deles, o qual recita Seus versículos para eles, e os dignifica e lhes ensina o Livro e a Sabedoria. E por certo, antes, estavam em evidente descaminho. Alcorão 62:2
وَمَا خَلَقۡتُ ٱلۡجِنَّ وَٱلۡإِنسَ إِلَّا لِيَعۡبُدُونِ
E não criei os jinns e os humanos senão para Me adorarem.Alcorão 51:56
Portanto, a dignidade humana está relacionada essencialmente à nossa ligação com Deus, à nossa fé, à nossa obediência e adoração ao Criador e só pode ser plenamente efetivada pela Sua Lei, a Sharia. Deus, O Altíssimo, nos dignifica ao nos entregar a Sua lei pura, que é o critério máximo justiça que nos garante, nesta vida, benefício e, na derradeira vida ainda, ainda mais benefícios.
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